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Doze tipos de Ansiedade Climática
Segundo o relatório “AR6 Synthesis Report – Climate Change 2023”, as actividades humanas, através das emissões de gases com efeito de estufa, por indústrias colonizadoras de extração e mineração massiva, assim como ecocídio e poluição generalizados, contribuem activamente para o aquecimento global e a perda catastrófica de biodiversidade em todo o globo.
Este aquecimento conduz a fenómenos meteorológicos extremos a nível mundial e a rápidas alterações na atmosfera, oceanos, criosfera e biosfera, que afectam desproporcionalmente as comunidades e ecossistemas mais vulneráveis.
Este momento de grande incerteza global, provoca ansiedade e desespero em alguns, especialmente quando se apercebem da inexistência de soluções. Do outro lado do espectro, há quem que se recuse a reconhecer os efeitos nocivos deste hiper-problema.
Como nos recorda Blanche Verlie no seu livro “Learning to Live with Climate Change: From Anxiety to Transformation,”, todos temos profundos envolvimentos afectivos entre os climas e temperaturas emocionais, mesmo antes de pensarmos nas alterações climáticas. A língua portuguesa está repleta de expressões idiomáticas que exprimem sentimentos por metáforas meteorológicas – “estás como o dia,” “dizer raios de coriscos de alguém,” “quem semeia ventos colhe tempestades,” ou mesmo as basilares ideias de alguém frio e sem emoções ou quente e colérico. Na verdade, a raiz da palavra temperatura é temperamento. Verlie recorda que usamos frequentemente ‘atmosfera’ para nos referirmos à aura, vibração ou padrões afectivos de um lugar, tempo, grupo ou evento. Estas práticas linguísticas parecem sugerir que compreendemos que as experiências humanas estão (sempre estiveram) intimamente relacionadas com a meteorologia.
“Começamos quase todas as conversas com o tempo, porque sabemos implicitamente que ele afecta o humor e o bem-estar uns dos outros.”
Acontece que, raramente exploramos coletivamente as intensidades afectivas das alterações climáticas, em toda a sua estranha e desconcertante complexidade, mas é, sem dúvida, através deste trabalho emocional e relacional que nascerão mundos mais habitáveis.
A seguinte lista é um barómetro que pode ser experimentado individualmente ou testemunhado a nível colectivo. Mas o trabalho não termina nesta observação, pois é importante, como reflecte Verlie, experimentar novas formas de nos identificarmos uns com os outros e com o clima, ajudando-nos a reinventar e a regenerar os nossos mundos. Estas práticas emocionais, relacionais e (sempre) mais-que-humanas contribuem coletivamente para as tarefas ontológicas, sociológicas e ecológicas de aprender a viver com as alterações climáticas. Trata-se de um processo aberto e imprevisível que será traumático, tanto devido às catástrofes provocadas pelas alterações climáticas, como porque a desidentificação de normas culturais profundamente enraizadas é dolorosa. No entanto, ao nos envolvermos coletivamente nestes processos inquietantes, talvez aprendamos, com as alterações climáticas, a viver em conjunto com o nosso planeta temperamental.
As Doze Emoções Climáticas
Os investigadores do estudo de 2023, publicado na revista Global Environmental Change, encontraram doze tipos de respostas emocionais às alterações climáticas, que reflectem as suas diversas e muitas vezes indeléveis consequências para a saúde mental.
Tristeza – Sentir-se triste, pesaroso e sofrer devido à percepção de que as alterações climáticas estão a mudar irremediavelmente o mundo e a causar grandes perdas à vida na Terra. Os indivíduos podem sentir-se sobrecarregados, stressados ou receosos relativamente às alterações ambientais e ao futuro incerto do planeta, às suas próprias vidas ou dos seus entes queridos, filhos e gerações futuras.
Raiva – Sentir-se zangado, ressentido, furioso, irritado e frustrado com a percepção de que as pessoas no poder não fazem o suficiente para mitigar as alterações climáticas ou que prejudicam intencionalmente o clima. Esta situação resulta frequentemente do facto de se testemunhar as consequências da degradação ambiental, do ritmo lento dos esforços de mitigação, da negação de provas científicas ou de respostas insuficientes por parte dos decisores políticos, das empresas e da sociedade em geral.
Irritação – Sentir-se irritado e aborrecido com a percepção da ignorância e da miopia da sociedade quando se trata de mostrar preocupação e abordar as alterações climáticas.
Apreensão – Sentimento de apreensão, medo e ansiedade devido à percepção de que as alterações climáticas constituem um sério obstáculo e uma ameaça à vida humana.
Impotência – Sentir-se impotente, pessimista, apático, inadequado, com falta de controlo e confuso perante a percepção de que se tem pouca capacidade individual para combater a escala e complexidade das questões ambientais globais e às mudanças necessárias para viver um estilo de vida verdadeiramente sustentável. A investigação mostra que os indivíduos experimentam frequentemente “solastalgia”, ou sofrimento psicológico resultante da degradação ambiental.
Culpa – Sentimento de remorso, culpa e perturbação perante a percepção de que o nosso comportamento afecta negativamente o clima. Aplica-se tanto a actividades que podem ser consideradas “prejudiciais para o ambiente” como à não realização de actividades que se considera que deveriam ser realizadas para reduzir o impacto no clima. Pode também referir-se a comportamentos passados que fazem com que um indivíduo se sinta culpado no presente.
Desesperança — Sentir-se sem esperança, pessimista, inseguro e sobrecarregado relativamente à percepção de que os efeitos mais catastróficos das alterações climáticas são inevitáveis.
Isolamento – Sentir-se só, refere-se a um sentimento de desconexão, isolamento ou solidão na preocupação e compreensão da crise climática e na percepção de que as outras pessoas não estão tão empenhadas no tema das alterações climáticas como o próprio. O isolamento climático, muitas vezes alimentado pela percepção de que as preocupações ambientais não são amplamente reconhecidas ou priorizadas pela comunidade em geral.
Esperança – Sentir-se esperançoso, confiante e com paz de espírito na percepção de testemunhar a implementação de soluções pró-clima e à crença no potencial de mitigação efectiva das alterações climáticas.
Capacitação – Sentir emoções positivas, alegria, uma sensação de força e significado, inspiração e energia em torno de testemunhar ou participar numa ação climática colectiva.
Desprezo – Sentir-se zangado, frustrado e descontente com a percepção de que as alterações climáticas são um problema exagerado que não deveria estar no centro das atenções das pessoas. O desprezo pelo clima é caracterizado por uma atitude de desconsideração ou desdém em relação ao discurso sobre as alterações climáticas. Aqui, os indivíduos minimizam a gravidade das questões ambientais, rejeitam o consenso científico ou demonstram falta de preocupação com as mudanças climáticas decorrentes de vários fatores, incluindo crenças ideológicas ou o desejo de evitar o desconforto de reconhecer a urgência e a gravidade da crise. Curiosamente, um estudo de 2023 concluiu que as pessoas que acreditam que o destino da Terra é secundário relativamente a uma existência eterna antecipada, ou uma vida transcendental após a morte, apresentam menor medo da extinção e são menos propensas a adotar práticas de sustentabilidade.
Indiferença – Sentir-se indiferente e aborrecido com a percepção de que as alterações climáticas não são um tema importante. Nem vale a pena empenhar-se especialmente no seu combate, ou negar a sua importância.
Ficar com o Problema
Precisamos de atmosferas suficientemente seguras para que nos sintamos apoiados para nos envolveremos nas violências fenomenais das alterações climáticas. Não podendo ser tão seguras que nos isolem e desculpem da nossa cumplicidade nessas violências. Em vez de proporcionar segurança ou uma terapia que acalme, precisamos de apoiar e ativar as pessoas para poderem “ficar com os problemas” das alterações climáticas, como diz Donna Haraway. [Verlie, 2021, pp.128]
“Ficar com o problema” é uma re-educação profunda numa psique aculturada a precipitar-se à solução, por mais redutora e linear que seja, ignorando a complexidade e as consequências fractais de cada movimento. É também uma re-aprendizagem no acolhimento a respostas singulares, locais e profundamente contextuais.
Estes lugares e relações inquietantes agitam-nos, ajudando-nos a libertar-nos da complacência do status quo através da expressão colectiva da nossa raiva, tristeza e culpa.
Precisamos de nos debruçar sobre as histórias injustas, os presentes incómodos e os futuros incontroláveis com que estamos inevitavelmente enredados, de modo a inspirar modos alternativos de ser. As atmosferas inquietantes e regenerativas criam, assim, um refúgio afetivo. [Verlie, 2021, pp.129]
Em dignidade e aceitação pela intensidade das nossas emoções, que instintiva e visceralmente respondem e expressam o que acontece nos biomas, criemos atmosferas inquietantes e regenerativas através do encontro coletivo, do testemunho e da narração das nossas histórias do mundo. Estes encontros inquietantes e regenerativos são compostos quando as pessoas são apoiadas para se envolverem afectivamente, respondendo pelas múltiplas inteligências e experiências que se sobrepõem, se intersectam, se compõem e se difractam. Sempre percepcionadas e vividas de forma diferente por pessoas diferentes, tal como as sensações de irrelevância, distância e abstração. Pois as alterações climáticas serão sempre mais do que aquilo que podemos compreender e renunciar ao desejo de poder conhecer, prever e, por conseguinte, controlar totalmente o clima é uma prática ética e de maturação racional e emocional importante.
Independentemente da abordagem, o objetivo não é julgar ou tentar mudar como as pessoas se sentem, porque não há uma forma correcta de se sentir em relação às alterações climáticas. O objetivo é apenas escutar, testemunhar como se deparam, testemunham e contam as suas próprias experiências. Dar testemunho e validar os seus sentimentos, sejam eles quais forem, exige empatia e compaixão e constrói confiança e respeito. [Verlie, 2021, pp.130]
Referências:
- Verlie, Blanche. Learning to Live with Climate Change: From Anxiety to Transformation. Taylor & Francis, 2021.
- Beyond climate anxiety: Development and validation of the inventory of climate emotions (ICE): A measure of multiple emotions experienced in relation to climate change.
- A Psychologist Describes 8 Types Of ‘Climate Anxiety’
- AR6 Synthesis Report – Climate Change 2023
🌳 Vários livros de diversos territórios, lugares de resgate da polimorfa Imanência.
Peregrinações caleidoscópicas em profundidade, às raízes da identidade moderna, em todos os seus preconceitos, intrínseca violência e absurdas limitações. Diferentes jornadas de amor pela poesia da complexidade, da diversidade e da metamorfose. Tecelagens de histórias vivas que nos recordam do que esquecemos, da sacralidade do chão e da Vida. Complementos ao vício da transcendência, em rigor e responsabilidade.