O Dia a Seguir da Tempestade

Ecologia da Loucura e do Luto, Corpo Contaminado, Mitologia e o Feminino do Fim dos Mundos

Prefácio de Telma Laurentino

Edições Corpo-Lugar

Se procuras respostas fáceis, este livro não é para ti.

Se vens em busca de certezas, prepara-te para o abalo.

Um livro para quem se atreve a escutar o que apodrece, sem pressa de florescer.

O livro O Dia a Seguir da Tempestade pode ser encomendado exclusivamente através desta plataforma. Embora o preço apareça em dólares, o valor é automaticamente convertido para a moeda do país de encomenda. O pagamento é feito por cartão de crédito, sem custos adicionais de desalfandegamento, e o envio é possível para qualquer parte do mundo.

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Corpos que Escutam

 

O mundo não precisa de mais olhos que observam ao longe, mas de corpos que escutam.
A hegemonia visual, como tantos autores já denunciaram, ensina-nos a ver de cima, a partir do planalto do privilégio, dissociados do chão que ruge. Ver tornou-se sinónimo de julgar, mapear, resolver, mas sem sujar, comprometer, ou pertencer. A visão limpa e distante transformou a Terra num objeto a ser governado, gerido e domesticado. Quando tentamos voltar, olhando para o chão já aqui, tropeçamos na dissociação, a beleza transformada em inspiração asséptica.

Os cenários urbanos onde a vida não-humana ainda pulsa, são só consolo momentâneo para uma mágoa nunca escutada.

Mas há uma atenção mais antiga, mais fértil, que não pede respostas, mas presença. 
Do meu livro, Um Lugar Feliz, nomeio o fascínio suave que abre as portas internas, onde a atenção repousa e o pensamento se regenera. A natureza não exige foco direto, simplesmente acolhe divagações e meandros involuntários. É nesse ritmo cíclico, orgânico e não-performativo que a alma recorda não haver urgência em entender, mas convites a escutar, uma e outra vez. A linguagem que vive nos limiares, a da poesia, do símbolo, do mito, conhece os enredos sinuosos, pois não resolve o paradoxo.

Esta é uma atenção fecunda para que outras formas de saber possam emergir.

Quando categorizamos ou extraímos significados demasiado cedo, podemos estar a domar o que ainda estava vivo. Nomear é, muitas vezes, um movimento de contenção, um impulso ocidental de transformar o indizível em limite e fronteira arrumada e definida. Mas o que é sentido profundamente nem sempre quer ser fixado. Fechado. Concluído. Parado. Nomeado. Dar um nome sem escutar é domesticar. E domesticar é, por vezes, silenciar. Precisamos recuperar práticas ancestrais de nomear em relação, sem capturar ou domesticar. Onde os nomes vivos são oferendas e ecos. Porque o mundo não precisa de mais categorias, mas de escuta pelo corpo, de mais corpos que saibam ser atravessados sem se defenderem, fechando-se da porosidade.

Este é um compromisso com o mundo.

Um pacto com o cheiro, o desconforto, o húmus e com a espera. A pausa. Uma combinação com o luto. A paciência. Uma aliança com o não-saber. A Terra não é imagem, mas compromisso. Ver, sentir, saborear, fabular, cheirar e escutar são práticas interdependentes. Porque o mistério nunca precisou de ser resolvido, apenas acolhido. Talvez a sabedoria não esteja no que conseguimos nomear, mas como damos colo ao silêncio. Porque o mundo precisa de mais corpos que escutam.

 

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