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Co-Regulação Ecológica

“A ansiedade ecológica é uma resposta natural a uma ameaça. E esta é uma ameaça muito real. A ansiedade e o luto climáticos são emoções ‘desprivilegiadas’. Como sociedade, ainda não lhe damos espaço como uma resposta emocional válida. É predominante, mas ninguém tem permissão para falar.”

–Leslie Davenport, Psicóloga e terapeuta do clima

Para falarmos de ansiedade ecológica é importante trazer o conceito de co-regulação. Apesar de que sempre que ouço falar sobre co-regulação fico sempre a achar que falta algo essencial a ser tido em conta. Pois nunca foi apenas humana, mas ecológica; nunca foi somente bi-direcional, mas multi-direccional; nunca foi “para acalmar”, mas profundamente sensorial e relacional. Assim como o espectro das relações simbióticas, que vai desde o mutualismo até ao parasitismo, também a co-regulação é fractal e diversa na forma de se desdobrar em cada corpo-relação.

A co-regulação é um termo utilizado em psicologia, que descreve genericamente a interação de cada participante que regula repetidamente o comportamento do outro. Trata-se de um processo vibrante, contínuo e dinâmico de regulação das necessidades do corpo e do sistema nervoso, e não uma troca de informações superficiais ou finais. A co-regulação é frequentemente aplicada no contexto das emoções, apesar de demasiado limitada a indivíduos em díade, descrevendo a dependência das emoções e comportamentos do parceiro –se existir co-regulação das emoções, o resultado será uma expansão da capacidade emocional. 

Aqui quero abrir o conceito de co-regulação, esta sabedoria mamífera de milhões de anos, a muito mais que uma díade apenas humana.

Entre os fluxos orgânicos de reunir e dispersar, pela interocepção como ponte à co-regulação, viajamos inevitavelmente através tensão e desconforto até ao encantamento e presença visceral. Fazemos parte de um processo vivo e não de uma forçada conclusão de calma e estabilidade.

Exatamente porque co-regulação não é acalmar, mas relação! Relação ecológica e biológica, como descrevem as já estudas hormonas despoletadas no processo.

Conforme referido no artigo, Ecological Co-Regulation, a co-regulação acontece com a nossa família multi-espécies, mesmo que tenhamos cortado as nossas relações com os parentes ecológicos. “A co-regulação ecológica é o processo através do qual regulamos entre espécies. Trata-se de uma restauração do nosso corpo ecológico. Vivemos numa cultura dominante isolada por espécies que reforçou a supremacia humana (o individualismo e o antropocentrismo).” A própria terra é um sistema regulador ecológico soberano e nós devemos recordar e desenvolver a nossa capacidade de parentesco e co-regulação ecológica, cuidando da nossa ligação primária.

E aqui residem alguns dos nossos dolorosos exílios: a apatia, a dissociação e incapacidade de sentir. Por falta de maturidade e contentor cultural, apenas procuramos o conforto e bem-estar, evitando tudo o que doa. Mas a co-regulação ecológica faz-nos sentir as dores e as violências do mundo. Colectiva e inevitavelmente viajamos através do luto, da tensão e desconforto até ao encantamento e presença visceral.

No artigo, A Natureza e o Sistema Nervoso, a autora refere como temos vindo ritmicamente a co-evoluir com plantas, animais, fungos, bactérias, clima, água e todos os elementos orgânicos. De como os seres humanos são inerentemente parte da sinfonia de ritmos e relações, pela variedade de entradas sensoriais combinadas com micróbios específicos e compostos químicos em contacto e absorvidos pelos nossos corpos. Muito para além da visão, as experiências totais vividas no ambiente, repletas de sons, cheiros, sabores e oportunidades tácteis, regulam a nossa experiência mamífera.

Por exemplo, os fitoncidas, os compostos orgânicos normalmente emitidos pelas plantas para fins defensivos, permeiam o ar em ambientes naturais, são antimicrobianos, aumentam a atividade do sistema imunitário e diminuem o stress. Tal como os iões, as partículas carregadas resultantes da radiação, raios cósmicos, ondas solares, quedas de água, trovões e luz UV, são particularmente abundantes em locais naturais e têm sido sugeridos como benéficos. Sabemos que os iões de ar negativos encontrados no exterior estabilizam o humor e aumentam o vigor, a simpatia e a facilidade de concentração. E, claro, muitos dos cem triliões de bactérias no nosso corpo provêm do solo, da água, das fezes dos animais e dos esporos. O microbioma é crucial para o funcionamento do sistema nervoso, e a diminuição da exposição devido a um estilo de vida higienizado em espaços interiores dificulta a nossa capacidade de beneficiar dessas relações.

Co-regulação Ecológica
aprofundamento multi-direcional

A co-regulação é, na verdade, uma necessidade biológica que todos os seres humanos têm de regulação recíproca; é como os nossos sistemas nervosos falam entre si e a comunidade ecológica não-humana, se ligam, se espelham e se ajudam mutuamente a sentirem-se suficientemente seguros à medida que nos movemos através dos vários estados de relação. Falamos de cuidado colectivo multiespécies e não apenas individual.

Quando entramos em plena reciprocidade nos relacionamentos, sentimos os fluxos e refluxos de cuidado, dar e receber. Reconhecemos todas as formas como somos alimentados e desejamos retribuir de forma igual e frequente. Lamentamos a perda de parentes não-humanos da mesma forma que lamentamos a perda de entes queridos humanos. Estamos prontos para responder em tempos de crise, como agora. 

{imagem: A Young Daughter of the Picts. Original public domain image from Yale Center for British Art}

🌳 Vários livros de diversos territórios, lugares de resgate da polimorfa Imanência. 

Peregrinações caleidoscópicas em profundidade, às raízes da identidade moderna, em todos os seus preconceitos, intrínseca violência e absurdas limitações. Diferentes jornadas de amor pela poesia da complexidade, da diversidade e da metamorfose. Tecelagens de histórias vivas que nos recordam do que esquecemos, da sacralidade do chão e da Vida. Complementos ao vício da transcendência, em rigor e responsabilidade.