No Escuro Rasgamos as Linhas e Cosemos a Teia
🫀Chegamos aqui desorientados e perdidos.
Pelo caminho escorregámos das certezas e convicções. Esfolámos a pele e cortámos a carne. Os muros que continham a estabilidade e a identidade abriram brechas profundas, arruinaram.
O corpo agitado, palpita à procura de chão seguro. A mente, ofegante, arqueja e recusa-se a capitular –pois não sabe como o fazer. A alma reverbera e, silenciosamente, recorda-se dos trilhos já percorridos –sussurra-nos: continua.
Aqui, na espessa e desconfortável membrana do não saber, no território vivo do mistério, tocamos a força e os fluxos da Vida.
Mas, para aqui chegar precisámos de nos partir, fragmentar e uivar de dor. Uma e outra vez. Para tocar este chão negro e fértil, foi necessário perder-nos de nós próprios. Suster o desconforto, a incapacidade e o desconsolo. A agonia e a angústia. Foi necessário rasgar as linhas e coser as teias, no escuro. Neste lugar, entre mundos, praticamos o carinho radical, o que acolhe e confia, apesar de não saber. Aqui, na espessa membrana de transição, apanhamos os cacos, compostamos expectativas, partilhamos o afecto e o luto. Corpos colectivos e afectivos. Reaprendemos a relacionar, mais profunda e vastamente. As certezas apodrecem agora, sem pressa, consumidas pela curiosidade. Aqui fazemos parte.
