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TEMPO DE LEITURA – 3 MINUTOS
Desaprender
Uma tigela de fruta-sabedoria
A cultura ocidental contemporânea ensina-nos que o conhecimento não ocupa lugar, que podemos armazenar no nosso cérebro milhares, ou mesmo milhões de dados, factos e acontecimentos difíceis sobre a realidade e a própria vida. Por isso, continuamos a procurar por ele, aprendendo, lendo e “melhorando”. Mas entramos em problemas quando chegamos ao limite da cultura, o significado dinâmico fundamental da realidade. Neste espaço limiar, estamos no limite do desconhecido, na fronteira da língua indecifrável. De tudo o que não sabemos, ou jamais saberemos, nem compreenderemos.
Este espaço limiar não é uma área de armazenamento. É uma fronteira de um fluxo vivo dinâmico de consciência.
Quando neste espaço-tempo profundo, temos de desaprender, de nos rendermos ao fluxo. A cultura ocidental é uma construção de armazenamento, onde tudo precisa de ser armazenado e assegurado, por medo do desconhecido, do mistério da vida. Por isso, não queremos deixar o conhecimento, quebrá-lo e abri-lo à transformação. Sentimo-nos profundamente inseguros quanto a deixar ir. Deixar de lado referências, margens, restrições, normas ou receitas comprovadas.
Parece mais seguro ver a realidade através das nossas lentes culturais aceites, por isso deixamos este óculo da modernidade moldar o que é percebido, dobrando o que é, ao que é suposto ser. Adaptando-o ordenadamente às nossas necessidades individuais, cortando os seus maiores significados à nossa realidade unidimensional.
Perdemos a ligação com o que é, na sua miríade de verdades e perspectivas. Tornamo-nos mais pequenos. Sozinhos. Insignificantes.
E sentimos que o encarceramento dentro de nós, sempre à procura de mais significado. Mas continuamos a seguir a mesma receita, os passos conhecidos e comprovados de armazenamento e confinamento das coisas para que possamos controlar-nos a nós próprios e à nossa realidade imediata. Estamos, desta forma, a trair o fluxo de sabedoria da vida pela ilusão de segurança.
É como ter uma tigela de fruta que eventualmente não comemos, e ela apodrece. Mas fazemos tudo ao nosso alcance para a manter para sempre, não deixando a fruta-sabedoria seguir o seu ciclo natural de renovação, prendendo-nos a crenças que confundimos com conhecimento. Eventualmente, nunca procuramos nova fruta-sabedoria. Tenha em mente que o único fruto que dura para sempre é um fruto de plástico. O mesmo acontece com o conhecimento ou perspectivas fixas. Uma realidade construída em torno de dogmas torna-se artificial e sem força de vida. Um sistema vazio, sem corpo, desprovido de significado sagrado ou emaranhamento. Preso a abstrações transcendentes e niilistas, que perdeu o contacto com a ecologia imanente. Não co-cria, em simbiose e regeneração responsável, pois apenas controla.
Quando chegamos ao limite da cultura e das verdades aceites, passamos por uma densa membrana de consenso social, dogmas e crenças. Por outro lado, há muitas línguas cósmicas antigas, ligações, e relações. Estranhas fronteiras de sabedoria – fronteiras que nem sequer acreditávamos que pudessem existir. Para abraçar o mistério deste fluxo de sabedoria altamente dinâmica, precisamos de desaprender. Tornarmo-nos novamente humildes, deixar tudo o que é esquecido, tudo o que parece impossível ou misterioso, tudo dentro para que se torne real na nossa experiência.
Forjamos novas relações a ritmos antigos. Encontramos novas possibilidades de ligações que abrangem o que é – cada momento, apenas estar presente no contexto multicamada das coisas. Aprendemos estando presentes.
A rendição a um estado de humildade é vital para deixar tudo fluir, deixando de lado a mente hierárquica. A sabedoria está à nossa volta, pulsando vibrantemente dentro e pelas relações de todos os sistemas vivos. Sentimo-la nos nossos corpos, tornando-se vasos através dos quais toda esta rica consciência pode fluir, deixando-nos acordados como nunca antes. Mais vivos e participativos na realidade das coisas. Afinal, sempre fizemos parte do fluxo.
🌳 Vários livros de diversos territórios, lugares de resgate da polimorfa Imanência.
Peregrinações caleidoscópicas em profundidade, às raízes da identidade moderna, em todos os seus preconceitos, intrínseca violência e absurdas limitações. Diferentes jornadas de amor pela poesia da complexidade, da diversidade e da metamorfose. Tecelagens de histórias vivas que nos recordam do que esquecemos, da sacralidade do chão e da Vida. Complementos ao vício da transcendência, em rigor e responsabilidade.