A Travessia da Precariedade

Nos muitos epicentros ocultos da policrise, entre hormonas descompassadas e toxinas quotidianas, vivem mulheres-a-meio-do-caminho. São as que cuidam, orientam, sentem demais e sobrevivem com quase nada. Apesar da sua experiência, dedicação e escuta do mundo, vivem vidas precárias. Têm de investir o dobro para receber metade, arriscar sem rede, sustentar casas, corpos e vínculos com uma mão nas costas, às vezes duas e de olhos tapados. Apesar de todos os privilégios da modernidade, enfrentam vidas incertas, onde têm de arriscar continuamente sem certezas de alguma vez sair da precariedade.

Vivem no fio de uma exaustão, o burnout hormonal que arde sem se ver, induzido pelas metamorfoses cíclicas e intensificado pelos tóxicos ambientais.

É a erosão sistémica do corpo que ainda tenta nutrir um mundo que não o sustenta de volta.

É desequilíbrio químico entre o que dói e o que se recebe, entre o que se sente e o que se pode dizer.

Conheço mulheres com diplomas, sabedorias e colo que sustentam famílias, equipas, projetos e comunidades. Mas o retorno é instável, silencioso e escasso. O mundo moderno exige que estejam sempre “prontas”, que não falhem, que se reorganizem sem jamais ruir. E se desabam? São chamadas instáveis, dramáticas, loucas. A intensidade incerta é o preço que pagam por sentir e pensar fora das normas domesticadas, em redes que em vez de cuidar mais facilmente as envergonham e humilham. “Tens de te conformar.”

Mas estão vivas e fervem por dentro, com os nervos à flor da pele e o coração a bater em ressonância com a Terra ferida. Mulheres que o mundo considera “a meio”, mas que estão inteiras, mesmo estilhaçadas. Estão a meio do caminho, sim, e o caminho que abrem não é de resignação, é de Vida.

🌳 Vários livros de diversos territórios, lugares de resgate da polimorfa Imanência. 

Peregrinações caleidoscópicas em profundidade, às raízes da identidade moderna, em todos os seus preconceitos, intrínseca violência e absurdas limitações. Diferentes jornadas de amor pela poesia da complexidade, da diversidade e da metamorfose. Tecelagens de histórias vivas que nos recordam do que esquecemos, da sacralidade do chão e da Vida. Complementos ao vício da transcendência, em rigor e responsabilidade.