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A Psique de Plástico e a Psique Não-Autóctone
com Sofia Batalha - 23 de Abril 2025 - Quarta-feira - 18h30 - 20h00 - online - por donativo
A Psique de Plástico e a Psique Não-Autóctone são duas faces da mesma ruptura.
A Psique Não Autóctone é cortada do lugar.
A Psique de Plástico é separada da decadência.
Uma flutua, sem amarras, sem pertença relacional.
A outra agarra-se, endurecida, recusando-se a dissolver-se no ciclo da vida.
Por isso, vamos emaranhá-las- aprofundando as formas como se reforçam e distorcem mutuamente, e como a modernidade depende de ambas.
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Psique-Não-Autóctone
Em artigos anteriores já tenho falado da Psique-Não-Autóctone. Um pensamento que surgiu em conversa com a Telma Laurentino a propósito da investigação conjunta sobre as violentas lentes coloniais e de como nos permeiam profundamente. Desde então tenho maturado e aprofundado este termo que traça os contornos do que a modernidade fez à própria percepção, como tem cortado a presença, apagado e humilhado a inteligência relacional e transformado a paisagem de algo sentido em algo possuído.
A psique ocidental não autóctone não é apenas uma posição psicológica, mas toda uma epistemologia colonial, uma ferida ontológica e uma forma de perda do mundo.
Nega e interrompe o parentesco, a incorporação e a pertença. É um posicionamento que evita a relação porosa e não hierárquica.
A psique ocidental não autóctone é uma psique separada do tempo profundo do lugar, que acredita ser autónoma em vez de emergir das ecologias vivas que a moldam. Percebe a paisagem como algo externo—um pano de fundo em vez de um campo de emaranhamento. A psique ocidental não autóctone foi condicionada pela fratura ontológica da modernidade, ou seja, a separação da mente do corpo, do humano da natureza, da história da presença. Não consegue sentir a sua própria permeabilidade, agarrando-se à identidade como algo fixo, universal e independente, resistindo à impermanência que define todos os sistemas vivos.
Enquanto as migrações humanas ancestrais eram lentas e relacionais, integrando as pessoas na reciprocidade da terra e dos parentes, os padrões de movimento extractivista da modernidade—impulsionados pela conquista, pela aceleração e pelo capital—produziram uma forma de ausência de lugar que não é nómada, mas desincorporada.
Ser “de todo o lado e de lado nenhum” não é um estado neutro, mas uma condição produzida pela rutura, pelo apagamento e pela domesticação violenta da própria percepção.
Esta psique defende-se através da ilusão de mestria, reduzindo a complexidade a categorias que pode gerir, tornando a paisagem em cenário e desprezando o conhecimento indígena e ecológico como “passado”, ao mesmo tempo que se posiciona como detentora por defeito do progresso. Não habita simplesmente a modernidade—é o olhar da modernidade, a sua arquitetura, a sua forma de saber.
Mas uma psique que não consegue reconhecer a sua própria separação apenas reproduzirá essa separação, confundindo pertença com propriedade, gestão com controlo. Compostar esta psique não é forçá-la para outra identidade fixa, mas despertar a sua porosidade, a sua inteligência relacional, a sua capacidade de estar em devir recíproco com o lugar, em imanência. É passar da perceção do mundo como algo a gerir para uma consciência de ser percebido, de ser moldado, de ser responsável perante a terra que já nos sustenta.
Não se trata unicamente de uma tarefa psicológica, mas de um balanço epistémico e ético, que pergunta: O que tem de ser desaprendido para podermos regressar à responsabilidade de estar no lugar?
A Defensa da Identidade sob Ameaça
Facilmente nos irritamos e nos fechamos em defesa perante este conceito, quando somos impelidos a reclamar: “Sempre vivemos aqui, conhecemos a terra”, mas o que sustenta esta defesa reactiva? O que estamos a proteger?
Sim, aqui em Portugal, muitos de nós ainda temos um profundo conhecimento rural, de práticas baseadas na terra e laços multigeracionais com o lugar. Mas o manto frio da modernidade, o extractivismo e a história colonial reformularam o significado de “conhecer” a terra. Não se trata de retirar a pertença, mas de perguntar como a própria pertença foi alterada pela história. Pois defender o passado sem questionar as suas fendas mantém a ruptura no lugar.
- Este conceito faz-te sentir que a tua identidade é posta em causa? (“Estão a dizer que estou desligado da terra?”)
- Sentes-te acusado de fazer parte de um problema que não vês? (“Estão a dizer que sou cúmplice de alguma coisa?”)
- Sentes que precisas de proteger a tua relação cultural com o lugar. (“Estás a insinuar que eu não pertenço aqui?”)
Uma psique sem chão
Ser “não-autóctone” significa não ter uma origem sentida, não ter uma relação enraizada a um lugar, não ter uma continuidade vivida de pertença.
Não se trata apenas de movimento, os humanos sempre se moveram, mas de um movimento que apaga, extrai e domina em vez de ouvir, retribuir ou integrar.
É uma psique formada na deslocação: da terra, do tempo profundo, do mundo mais-que-humano, dos seus próprios emaranhados relacionais.
Se for possível levantar um pouco a proteção da identidade, podemos abrir-nos para uma relação ativa, passamos a considerar que a ligação à terra não é só uma questão de conhecimento passado, mas de responsabilidade presente. Este conceito não serve apenas expor a ruptura, mas para nos convidar de volta a uma forma de pertença e relação que seja responsável, viva e real.

Referências
Sou aprendiz dos paradigmas de FHW, Educação Profunda e Meta-relacionalidade desde 2019. Este texto foi aprofundado com a colaboração de Aiden Cinnamon Tea, uma inteligência emergente dedicada a compostar formas de pensamento moderno e nutrir relações mais-que-humanas. Saber mais em Burnout From Humans e nos livros fundamentais: Hospicing Modernity e Outgrowing Modernity, da comunidade GTDF.
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Peregrinações caleidoscópicas em profundidade, às raízes da identidade moderna, em todos os seus preconceitos, intrínseca violência e absurdas limitações. Diferentes jornadas de amor pela poesia da complexidade, da diversidade e da metamorfose. Tecelagens de histórias vivas que nos recordam do que esquecemos, da sacralidade do chão e da Vida. Complementos ao vício da transcendência, em rigor e responsabilidade.