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Ecopsicologia Relacional

Uma Ética de Implicação Ecológica

 

Num mundo onde o cuidado ainda é frequentemente tratado como moral, fardo ou virtude individual, a Ecopsicologia convida-nos a outro horizonte, o do cuidado como implicação ecológica. Não como dever, mas como respiração conjunta com tudo o que vive, e tudo o que morre. Estas palavras são um convite a atravessar o estreito da psicologia normativa ocidental e a abrir espaço para uma teia viva, relacional e emaranhada.

Do Dever ao Enredamento Vivo

Na tradição moderna, o cuidado é muitas vezes entendido como uma ação moral, individual, movida por culpa, sacrifício, superioridade, idealismo ou expectativa. Mas quando olhamos pela lente da Ecopsicologia Relacional, percebemos que o cuidado é anterior ao dever. Não nasce da vontade individual, mas da consciência de que já estamos comprometidos e emaranhados, a nossa pele sempre tocou a pele da Terra. Nesta teia viva, cuidar não é escolha, é resposta. Não é sacrifício, é relação. Aqui, o cuidado não é uma escolha racional ou virtude pessoal, mas uma resposta sensível às interdependências que já nos constituem. Não cuidamos porque somos “bons”, cuidamos porque somos parte. Porque a ferida da Terra é também uma dor nos nossos nervos.

O cuidado emerge como um gesto de reconhecimento, o que afeta a água, afeta o meu corpo; o que adoece a floresta, murmura nos meus sonhos.

Da Intervenção ao Escutar no Corpo

A psicologia normativa tende a abordar o sofrimento como falha a ser corrigida ou eliminada. Obsessivamente gerando fórmulas, modelos e hierarquias de saber. Há o impulso surdo e constante para intervir, curar, emendar. A Ecopsicologia Relacional propõe outra forma de presença, escutar sem urgência de resolver. A ética da implicação ecológica escuta o sofrimento como expressão relacional, eco de dinâmicas vivas e sistémicas. O sofrimento, aqui, é sinal de uma desregulação relacional e sistémica, não um problema a ser eliminado ou higienizado, mas uma expressão a ser sentida. Estar com o que dói, escutar os lutos da terra, os silêncios dos rios, as quebras de sentido, é prática ecoterapêutica. A cura não como correção, mas como digestão lenta.

Não se trata de “resolver o problema”, mas de compostar as condições que nos trouxeram até aqui.

Da Autonomia ao Parentesco Responsivo

A psicologia moderna elevou a autonomia individual a um ideal. O “eu” é visto como centro, sujeito separado, auto-centrado, dono de si e autor da sua narrativa. Mas a Ecopsicologia Relacional desloca esta centralidade, pois somos compostos por vínculos, o eu é tecido. Um lugar não separado, mas de passagem de histórias, ecossistemas, afetos e ancestralidades. A responsabilidade, então, não vem da obrigação, nem da decisão racional sobre “fazer o certo”, mas da escuta dos vínculos que nos chamam e compõem. Do musgo que cresce nas pedras da infância, da água que chega pelos canos, mas vem de um rio ferido. Do silêncio de um animal extinto.

Da Purificação à Compostagem Ética

Na ética moralizante e moral normativa, procura-se a pureza, desde o pensamento certo ao sentimento justo, até ao comportamento adequado, passando pela obsessão urgente de separar o certo do errado, o saudável do doente, o humano do não-humano. Mas ética da implicação ecológica reconhece que estamos todos emaranhados em resíduos, contradições, derrames e ambivalências. A Ecopsicologia Relacional convida-nos a habitar o limiar em maturidade responsável. A estar com a confusão, os paradoxos, e a lama dos processos vivos. Pois não existe “fora” da relação, nem neutralidade. A saúde não é limpeza ou separação, mas a capacidade de metabolizar o que é difícil, contraditório e tóxico até, sem nos expulsarmos ou exilarmos das relações. Esta é a compostagem ética, a metamorfose lenta, íntima e profundamente viva.

Pois cuidar é um processo de desarmar as pretensões de superioridade, de descentralizar o humano, de acolher a lama e a luz como partes do mesmo ciclo.

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{Ecopsicologia}

🌳 Vários livros de diversos territórios, lugares de resgate da polimorfa Imanência. 

Peregrinações caleidoscópicas em profundidade, às raízes da identidade moderna, em todos os seus preconceitos, intrínseca violência e absurdas limitações. Diferentes jornadas de amor pela poesia da complexidade, da diversidade e da metamorfose. Tecelagens de histórias vivas que nos recordam do que esquecemos, da sacralidade do chão e da Vida. Complementos ao vício da transcendência, em rigor e responsabilidade.